Tuesday, December 07, 2010

   ...uma coisa puxa a outra, e, sem saber muito como, eu fui parar no portal da Hilda Hilst. E enlouqueci com o diário dela, que eu sou voyer minha gente e uma janela assim pra intimidade de uma pessoa como a Hilda é irresistível. Aquelas páginas amareladas e aquela caligrafia tensa, de coisas escritas com pressa, aqueles pensamentos todos acontecendo ali na página. Tudo muito fascinante.
   Mas desde então ando meio culpado, de ter invadido a intimidade, culpado de uma certa perversão. Será que todo escritor que escreve um diário quer mesmo que ele seja lido? E se a resposta for não, por que então o fazem? E que direitos tenho eu de conhecer as minúcias da vida da autora, coisas como sua falta de grana, ou a sua relação com a birita?
   É que eu sou de um tempo ainda sem reality TV, sem facebook, twitter. Nos dias atuais, privacidade não é mais direito do cidadão, não existe mais a vida privada, tudo é público, tudo é exposto com estardalhaço, dos dramas mais graves aos pequenos detalhes mais fisiológicos. O voyerismo perdeu o charme, a aura de perversão proibida, virou esporte, financiado e explorado pelas grandes corporações, não existe mais o indivíduo, somos todos do grupo, do coletivo. Eu gostava mais quando a gente se agitava com uma olhada rápida pelo vão da cortina, pela fresta, fechadura. E quando ainda era raro uma oportunidade de se bisbilhotar a intimidade de gente genial como a Hilda e não dessa matilha feroz de idiotas dos Big Brothers e outros afins.

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